Movimentos sociais, enfim, são redes sociais complexas, que transcendem organizações empiricamente delimitadas e que conectam, de forma simbólica, solidarística e estratégica, sujeitos individuais e atores coletivos em torno de uma identidade ou identificações comuns, de uma definição de um campo de conflito e de seus principais adversários políticos ou sistêmicos e de um projeto ou utopia de transformação social.
As identidades e os conteúdos das lutas podem ser específicos (ambientalista, feminista, étnico etc.) ou transidentitários (eco-feminismo, anti-racismo ambientalista, etc.). O emergente Movimento Quilombola é um exemplo de um movimento com referenciais da subordinação histórica de um grupo social – os quilombolas – por sua condição originária de raça/etnia e de classe, conforme exemplo abaixo:
- a identificação étnica (negra) e de classe (camponeses pobres) – a identidade coletiva;
- para combater um legado histórico de colonialismo, racismo e expropriação – o adversário comum;
- pelo direito à terra comunitária herdada e ao reconhecimento de sua cultura – o projeto de transformação.
Em síntese, movimentos sociais na sociedade contemporânea podem ser mais amplamente explicados quando os atores sociais ou formas de coletividade que os compõem forem tratados a partir de uma perspectiva de análise de redes sociais e organizacionais. Portanto, quando elegemos como conceito teórico a noção de rede de movimentos sociais referindo-nos à síntese articulatória, à amálgama ou às redes das redes do agir e pensar coletivo representadas através de diversos formatos organizacionais não estamos abandonando a tradição de análise já clássica na literatura dos movimentos sociais, ou seja, a ideia de que um movimento social existe quando há:
- um princípio de identidade construído coletivamente ou de identificação em torno de interesses e valores comuns no campo da cidadania;
- a definição coletiva de um campo de conflitos e dos adversários centrais nesse campo;
- a construção de projeto de transformação ou de utopias comuns de mudança social nos campos societário, cultural ou sistêmico.
Estamos, sim, ampliando a análise dos movimentos sociais na medida em que consideramos a interação em redes como algo constitutivo dos movimentos sociais. Essa ideia já está presente em vários autores, como nos trabalhos de Touraine, Melucci e Castells já mencionados, todavia distinta da tratada acima e que será melhor explicitada no decorrer desta obra. A rede de movimentos sociais refere-se, pois, à uma comunidade de sentido que visa a algum tipo de transformação social e que agrega atores coletivos diversificados, constitutivos do campo da sociedade civil organizada.